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As Melhores do Gutty . . .

      Tô Bão ! 

O Gutty e sua digníssima, Lilí, são grandes amigos. Já desde o início, pois começamos nossa amizade em uma oficina de Jeep. 

E quer melhor lugar para começar uma amizade ? Na época ele acabara de comprar o Jeep, e eu reformando minha Rural, e, como sempre, consertando o Edwaldo, meu Jeep.

É uma figuraça, não só pelo senso de humor, como por sua figura propriamente dita. Depois de um acidente, ele foi obrigado a conviver com um par de muletas, o que me obrigou a uma ponta de humor negro, chamando-o de manqueba ou de mula-manca, mas na verdade ele era o único jipeiro 4x4 que eu já conheci. Quando estava com as muletas, é claro.

Mandou arquear as molas mais altas, trocou os jumelos e colocou pneus 750x16, aumentando, e muito, a altura do Jeep. Resultado: um tamborete de plástico dentro do Jeep, para servir de escada nos embarques e desembarques. Ai era uma confusão. Tira banquinho, guarda muletas, sobe no banquinho e entra no Jeep. Então ficava esperando uma alma caridosa para pegar o banquinho, já que ele não conseguia. Devia ter amarrado um barbante no tal banquinho !

O Jeep dele, depois de muito gastar, e que a Lilí não leia isso se não ele vai precisar demais das muletinhas, terminou como o mais bonito que conheço. Tô falando de Jeep equipado, pois original é o Edwaldo mesmo e não de discute. Deixem eu falar baixinho aqui: A Lilí num sabe do preço de tudo não. 

O Gutty é o único que conheço que trocou o motor BF 161 moído por um BF 184 gastando 20 dolares. Tá em dolar porque não sei se daqui um tempo vai dar para lembrar do valor, se bem que isso oscila muito, e distorce a verdade. R$50,00, pronto ! "Foi só um negocinho atôa e o Jeep ficou bom !" Só que ela não é boba mesmo, mas faz cara de desentendida, permitindo que ele continue a farra. Deu prá ver a cara de dissimulada dela quando ele chegou em casa: "Bem ! Comprei um presente para voce me dar de Natal. Um hôdometro digital. Tô cansado de ganhar roupas, e esse foi bem baratinho. Só R$ 60,00..."

Também faço as minhas, como aquela que não esqueço, quando arranquei a faixa do pedágio da gincana de uns colegiais no peito do Edwaldo, com o Gutty aplaudindo pelo rádio, logo atrás, numa banguela de um estradão. Acho que eu estava mesmo era com medo do Gutty não parar ! Também eles não resolviam se abaixavam ou levantavam a tal faixa. E a Rose também remendou: "Desce o pau !" Obedeci ! Mas esta aqui não é para as minhas, mas para as do Gutty, então, vamos lá.

Nosso primeiro passeio foi nos 7 rios. Ele com o Marconi, colado atrás, gritando no rádio que a poeira é doce e jogando moedas para a Rose, minha mulher, que sempre vira zequinha, enquanto ela fechava tronqueiras e porteiras. E eu falando para ele “sodar” quando passava por alguém, o que lhe rendia uma expressão de interrogação exclamativa. Gostou tanto, que durante a volta para Belo Horizonte, pela MG 10, entre as broncas porque eu estava andando devagar, insistia para que voltássemos no próximo final de semana. E eu: “Calma Gutty. Jeep anda é devagar mesmo. Além do mais eu fico muito stressado passando dos 60 Km/h. E outra: Minas é muito grande para repetirmos o mesmo roteiro em seguida.” 

Segunda-feira ele me liga desesperado. O Jeep dele tinha dado só 3 por litro. Desorientou tanto com a bebedeira do Jeep que deu um jeito de trocar a bóia, a agulha e colocou logo um calibre 22 no pulverizador principal.

O segundo passeio foi Lavras Novas. Era a época propícia de irmos. Final da Copa do Mundo. Num ia precisar nem reserva, pois estaria bem vazio, do jeitinho que a gente gosta. Além do mais o Gutty e a Lilí não iam trabalhar no domingo. Isso mesmo ! A pá deles é tão virada que eles trabalham é no domingo ! Encontramos no Posto Chefão às 7:00 e depois do lanchinho o Gutty foi puxando. “Conheci uma trilha legal até Rio Acima”. 

Depois duma confusão danada para achar a entrada da trilha, subimos o morro atrás da Skol. O Gutty me para no meio do morro. “Esse Jeep num ta andando nada. Troca do gicleur pra mim. Coloca o 25 prá ver se melhora”. Além dele num saber nem onde poderia se colocar esse tal gicleur, gargulante, calibre, era melhor eu fazer tudo. Se não ele tinha que ligar a tração, pegar o banquinho, engatar a reduzida e apear o Jeep. Ia demorar demais. Serviço pronto ele me coloca uma primeira reduzida e acelera. No topo do morro paramos para apreciar a vista. Então eu aviso à ele: “Num precisava primeira não, Gutty. Segunda já dava e sobrava, e pelo amor de Deus, passa o seu PX para AM porque FM é só você quem tem, mais ninguém...”

Ele me perdeu o caminho umas 15 vezes, alem do Jeep dele estar agarrando a bóia e agulha novas. Custamos mais saímos num estradão, e uns 5 kms pra frente tinha uma placa: BR 040. Ele grita satisfeito no rádio: “BR 040, é esta que vai para Rio Acima !”. Respondi: “Vamos pra trás, mula manca, porque ai vai voltar é no Posto Chefão”. Isso depois de mais umas 10 paradas para uma marteladinha no carburador. Na terceira batidinha, cansei de ficar pegando martelo na caixa de ferramentas, e achei um porrete todo sujo de minério de ferro. Surrei o carburador e dei o porrete pra Lilí. “Guarda isso dentro do Jeep, senão ele num anda mais”.

Conseguimos sair em Rio Acima, parando na Tia Lúcia, no alto da Serra do Espinhaço, para uma cerveja e um tira-gosto. Isso ao meio-dia... Resolvemos seguir por estradões, passando por Glaura e São Bartolomeu, pegando uma trilha só no finalzinho, por dentro de uma fazenda da Alcan, já em Saramenha, ou então a fome ia ser enorme... 

E eu falando no rádio prá ele “sodar” o pessoal. Já na serra da tal trilha, a Rose dirigindo o Edwaldo, me para por causa de uma mina d’água no meio da estrada. “O que qui é isso Rose ? Em vez de sentar o pé, você me para nesse morrão enquiabado com um buraco na frente ?...” “Vocês estão exigindo muito de mim”, responde ela, com um "não dirijo mais" nas entre-linhas. Escolhi um cantinho meio no mato, meio na estrada, escorreguei e subi, parando mais acima para esperar o Gutty. Até desliguei o motor esperando, porque o Gutty não despontava na curva nunca. 

Dois minutos passados, só se ouvia um monte de urro de motor Willys, que não parava mais, acabando com a tranquilidade do lugar. A Rose se vira pra mim e diz: “Acho melhor você ir lá ajudar o Gutty”. Desci o morro e os urros de motor não terminavam. 

Fui chegando e vi a Lilí abaixada na frente do Jeep. Aumentei o passo percebendo que o sufoco estava grande, mas logo vi o Jeep surgindo na trilha. Foi ai que notei que a Lilí estava era tirando fotos. “Pô Gutty. Nem avisa no rádio que está tirando fotos ?” “Não, rapaz. A coisa ficou feia mesmo. Custei sair do buraco. A Lilí estava era registrando o sufoco”. Depois que vi as fotos tiradas por trás é que notei que o Gutty tinha socado tanto o buraco que patrolou tudo, deixando uma avenida aterrada para trás. Também, só prá variar, tinha usado todo o torque de uma 1ª reduzida acionada por um reator Willys BF 184, com toda aquela sua delicadeza peculiar. Aterrou o buraco ? Ai sim ! Sem buraco é mais fácil. - Já notaram que o Gutty num é o mais técnico dos jeepeiros ? Mas com certeza é dos mais destemidos, e está sempre pronto pra encarar qualquer demanda. Sem finesse e com muita força bruta, é claro ! - Daí pra frente, Lavras Novas já pertinho, chegar foi fácil. Também 10 horas e meia nos 130 Km ! Média ótima.

A chegada em Lavras Novas tem mais uma do Gutty. Como nós não conheciamos o local, sai devagarzinho pescoçando, feito ganso, uma pousada razoável e de preferência bem pitore$quinha, pois jipeiro tem que economizar no pouso para gastar no posto. No finalzinho da rua achei uma pousada legal, e notei que já tinha visto algumas fotos no site desse distrito de Ouro Preto. Eis que me aborda um senhor de pequena estatura e chapéu na cabeça, que depois descobri que se tratava do lendário Sr. Domingos, dono da pousada : “Bem vindo, Gutty. Vamos apear.” E eu: “Não senhor, o Gutty é aquele do outro Jeep”. Como é que ele sabia de um tal Gutty num Jeep ? O danado tinha feito uma reserva com medo de não achar lugar e não tinha me avisado. 

Que medo sem lógica, para um final de semana com final da Copa com o Brasil jogando ! O Sr. Domingos, então, rapidamente segue em direção ao Jeep do Gutty, já emendando à distância: “Bem vindo, Gutty. Vamos apear. Eu sou o Domingos e estou aqui para o que você precisar.” Meu destemido amigo urbanoide solta a sua: “Não senhor! Obrigado. Eu não fumo.” Eu já chegando no Jeep do Gutty, sai ao seu socorro, aproveitando pra dar nele uma sacaneada, revelando o até então mistério: “Hiiiiiii, Sr. Domingos! O Gutty já ta variando depois de tanta poeira. Acredita que nem sodar o pessoal ele soda! O senhor não acha de boa educação o viajante sodar por quem passa pela estrada? Apeia logo daí, atentado!“ A partir desse dia, e não precisa nem avisar pelo rádio, se você ver um Jeep verde passando por alguém numa estrada de terra, com duas pessoas com meio corpo para fora, abanando freneticamente os braços, tenham uma certeza: É o Gutty e a Lilí !

 À noite, idéia do Gutty, fomos à uma pousadinha finí$$$$$$ima para conhecer. Tiramos umas fotos, eu dormi na rede, e se não me acordassem passava a noite ali mesmo. Na manhã seguinte após belíssimo café, começa o jogo do penta. Enquanto o pessoal gritava lá dentro, “fura o meu, Ronaldinho”, eu fui fazer o que mais gosto, trocando a bóia e a agulha do carburador do Gutty, pois, antes que me esqueça de dizer, o porrete brilhando de minério já tinha funcionado demais. Ele até que veio me dar um apoio moral, traçado com as muletinhas, mas eu dispensei: “Pode ir ver o jogo, Gutty. Estou no melhor lugar do mundo. Assentado num para-lamas de Jeep, acompanhado de um cigarro de palha, uma lata de cerveja e meia canequinha de pinga, sem nada pra pensar, enquanto vejo tanta montanha sair do meio da cerração, e com um serviço gostoso servindo de desculpa.” Só faltava o Chico me fazendo companhia, mas nessa época ele ainda estava adestrando no canil.

A tal canequinha de pinga, que virou acessório indispensável no Edwaldo-o meu Jeep, já devem ter descoberto-, pois é ela quem, enrolada num saquinho, me tampa a boca do litro de pinga do JP, lá de Pompeu em Sabará, ou pinga melhor que aparecer. O litro de pinga também é outro acessório indispensável, e isso até dispensa comentário, pois já é sabido que Jeep só da ponto e marcha lenta se tiver um litro de pinga atrás do banquinho traseiro. Voltando à canequinha, ela guarda também uma outra do Gutty. Desta vez foi para os lados de Ipoema, quando eu vinha na frente de mais três Jeeps. Vi então uma canequinha esmaltada jogada no meio da estrada. 

Parei rápido o Jeep, pulei, e fui correndo, abanando a mão, sinalizando para que ninguém me fizesse o favor de atropelar a canequinha. Desvia um Jeep, o outro consegue evitar o atropelamento, e lá vem o Gutty no final da fila, e, pelo que parecia, num estava vendo nem eu, quanto mais a canequinha. Batata ! Pegou a pontinha da canequinha com a quina do pneu, mandando ela longe. Acho até que ela era beje, mas ficou branca depois dessa. Segui a sua trajetória com os olhos e corri para o resgate quando ela cansou de pular. Examinei a canequinha e vi que apesar do destrato ela ia ser de muita serventia. Vim andando, e passando ao lado do Gutty, ele me toma a canequinha da mão, faz nela um carinho retirando um pouco da poeira, examina os lascadinhos no esmalte, e com aquela sua cara de exclamação dispara: “É Deus quem cuida das canequinhas nestas horas !”

A última do Gutty, depois de tantas outras após a anterior, foi no morro do Careca em Rio Acima, durante um passeio planilhado. Paramos no pé do morro para olhar a vista, enquanto alguns brincavam subindo o morrão. Um Samurai que estava tentando subir ficou sem motor antes do topo. O Gutty que não ia ficar sem subir mesmo, pulou - isso mesmo, pulou, pois ele já não é mais o mesmo jipeiro 4x4 depois que abandonou as muletinhas - no Jeep junto com o Pirica primo dele, e mandou: “Vamos nessa!” E eu: “Vai lá Gutty. É só ir de 2ª reduzida até a subida apertar, dá duas debreadas para engatar a 1ª com mais velocidade e não perder embalo, daí é só usar a sua delicadeza que o BF 184 não há de te faltar.” 

Lá foi o Gutty ! Fácil. Só escutei pelo rádio toda a satisfação do Gutty gritando pelo rádio, com o PTT na mão: “Eu sou foda!...” 

Na fração de segundo que se passou deu para eu imaginar que o motivo de tanta satisfação era a 1ª bem engatada, foi quando ele remendou: “Esqueci de soltar o freio de mão. Subi com ele puxado!...”

Esse é o Gutty. É meu amigo! E certeza eu tenho que ele não há de me faltar com uma das suas em todas as empreitadas que virão.

Como essas histórias já tem algum tempinho, já deu tempo do Gutty comprar um canguiço e entrar para a bancada Ruralista, ele tem agora também uma Rural. 

Bem feito ! Tá que nem eu. Dois Willys vazando na garagem. Esse tempo também foi suficiente para o Gutty e a Lilí fazerem o Luiggi. Já tô até vendo... Vou ter que aguentar os dois !

Abraço à todos,

31/08/2003

        Walter Júnior - B. Hte. -

waltergjunior@waltergjunior.com  

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